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Foto do escritorManuela Ferrer

Como nasceu o José Saramago Ensemble Jovem

Contado na primeira pessoa, pela voz do Manuel De Almeida Ferrer, um dos mentores e diretor artístico deste projeto maravilhoso, aqui vos deixo eu que nada mais posso agora acrescentar. No final do texto, convido-vos a ver e ouvir os teaser que preparei para a divulgação do concerto inaugural.


José Saramago Ensemble Jovem

"É engraçado observar as ideias que nascem naquele momento que certos indivíduos chamariam de inspiração, epifania, ou puramente criatividade espontânea. A maioria destas ideias tomam contornos quase utópicos, inalcançáveis; a princípio parece algo brilhante, a necessidade óbvia que temos estado a ignorar, mas rapidamente nos apercebemos que não olhámos para todos os detalhes com a devida atenção, que levá-las a cabo requereria um esforço hercúleo, ou apenas que ninguém as iria apoiar. Em certas ocasiões, acabamos mesmo por tentar cumprir o nosso impulso, organizá-lo bem, arquitetar tudo de uma forma lógica, mas acabamos sempre por esbarrar contra uma impossibilidade de alguma ordem, normalmente após demasiado esforço organizativo. No entanto, de quando em vez, surgem aquelas ideias raras, com aspeto estapafúrdio e em ambientes inesperados, ideias que tomam corpo e forma e, por alguma razão (acaso, talvez?), avançam, materializando-se, após uma longa e árdua preparação, em algo que se possa dizer palpável. É uma destas ideias que eu quero, aqui, partilhar. No passado mês de Maio, estando eu numa das minhas curtas vindas a Lisboa, sentava-me com a Marisa Silva e o Gabriel Correia. Bebia-se café, e falava-se de música – falava-se de Brahms e de música de câmara e, mais especificamente, do Trio com Trompa que este havia escrito em memória de sua Mãe no ano de 1865. Rapidamente nos apercebemos que tínhamos ali presente todo o elenco necessário à execução de tal obra, bem como à execução do seu irmão mais distante escrito por Ligeti, um século mais tarde, e tal ideia começou a ganhar vagamente forma. A conversa continuou, evoluindo, ganhando vida própria, e, de alguma maneira, transformou-se em algo diferente: o que começou com três músicos a discutirem um possível concerto metamorfoseou-se num projeto muito mais ambicioso, que envolvesse muito mais gente e mais do que uma única ocasião. Não poderia, na altura, ter adivinhado que este meu regresso temporário à minha cidade teria um resultado tão distante daquilo que eu havia planeado, dando origem a algo que em breve viria a ser por mim tão acarinhado.E assim apareceu a semente da ideia de criar um ensemble de música de câmara, semente que, regada pelo nosso entusiasmo e vontade de tocar em conjunto, fazer música nesta forma tão refinada e de uma qualidade retórica incontornável (já dizia Beethoven que um quarteto de cordas é uma conversa entre quatro indivíduos extremamente inteligentes?) e levar esta nossa arte a um maior público, pois é essa, ultimamente, a missão do artista.O processo foi rápido – creio que foram quatro ou cinco os dias que se haviam passado entre a conceptualização do Ensemble e a listagem quase completa dos seus músicos. A Marisa e eu fomos recebidos com um enorme entusiasmo por todos os que contactámos, algo que nos deixou agradavelmente surpreendidos – afinal, esta iniciativa tinha pernas e cabeça, tinha um corpo e estava viva. Só não tinha ainda nome.

Felizmente, a minha Mãe, num daqueles momentos de clarividência que só as Mães possuem, deu-nos a solução: devíamos apelidar o Ensemble com o nome de José Saramago. E porque não? Fazia sentido dar, a este nosso Ensemble o nome do Prémio Nobel da literatura, alguém que tão fortemente contribuiu para o desenvolvimento da cultura e da língua portuguesa; nenhum grupo musical o havia feito antes. Além do mais, que melhor escolha para um Ensemble de câmara, focado, por virtude da própria natureza deste género, na capacidade que a música tem de “falar” – levantar perguntas, apontar respostas, despertar inquietações e emoções que a língua, por vezes, não pode traduzir – que um nome (e não qualquer nome, de facto!) de alguém ligado à arte da palavra? E assim ganhou nome o José Saramago Ensemble Jovem!, em homenagem ao autor de “O Ano da Morte de Ricardo Reis” e tão calorosamente adotado pela Fundação José Saramago, que nos recebeu de braços abertos e com todo o entusiasmo. Os seguintes meses, desde Maio até Novembro, foram passados nos restantes detalhes da edificação deste projeto, desde os pequenos ornamentos aos grandes pilares, de modo a que tudo fluísse naturalmente até ao momento da inauguração.É para esse mesmo momento que gostaria de vos convidar, pois esta longa jornada que se avizinha será muito mais gratificante se a nós se juntarem, fazendo dela também parte, começando já esta terça-feira, dia 29 de Novembro, às 18h30, na Fundação José Saramago, inserido nos Dias do Desassossego’16. Lá vos esperamos com o enorme prazer de quem partilha a sua arte com quem quer que a queira ouvir!


Manuel De Almeida Ferrer


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